Ministério Público de Contas de Minas Gerais quer mudar julgamento sobre o IPTU de Contagem

Procurador pede reforma de sentença, com imposição de multa a Carlin Moura e Marília Campos por suposta irregularidade envolvendo a isenção do tributo municipal

A discussão sobre a isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) residencial, em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, ganhou novos contornos recentemente. O Ministério Público de Contas de Minas Gerais (MPC-MG) quer modificar a decisão, do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), que livrou os ex-prefeitos Carlin Moura – à época, no PCdoB; hoje, no PDT – e Marília Campos (PT) de sanções pelo cumprimento da lei municipal que estabelecia a gratuidade. Em setembro deste ano, a corte julgou improcedente as alegações do procurador Marcílio Barenco Corrêa de Mello.

Cerca de dois meses depois, contudo, o representante do MPC oficializou recurso pedindo a anulação da decisão. Ele solicita, além do reconhecimento de suposta irregularidade, que Carlin e Marília sejam multados em R$ 35 mil e declarados inabilitados, por cinco anos, ao exercício de cargos em comissão ou de confiança nas administrações estadual e municipal. 

Paralelamente à discussão nos tribunais, a Câmara Municipal analisa projeto que pode modificar o índice de correção inflacionária sobre o IPTU – cuja isenção caiu em 2016. A prefeitura apresentou, ao Legislativo, projeto que adequa os tributos municipais ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador que norteia a construção do orçamento local. Atualmente, para impostos e cobranças públicas, vale o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M). A última lei sobre isenção do IPTU entrou em vigor em 2001, na gestão de Ademir Lucas (então no PSDB, agora filiado ao Podemos). A proposta foi enviada pelo poder Executivo e aprovada pelos vereadores. 

O Ministério Público de Contas enxerga irregularidades que teriam ocorrido entre 2012 e 2016, período que compreende o último ano do segundo mandato de Marília e toda a gestão Carlin. No pedido de reforma da sentença, Marcílio diz que critérios ligados à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) acabaram ignorados. Segundo ele, o benefício foi concedido “sem qualquer demonstração, nas leis orçamentárias supervenientes, da estimativa e compensação da renúncia de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado”. Para o procurador, “atos omissivos” dos gestores causaram “graves prejuízos aos cofres públicos e à execução de políticas públicas, em detrimento da coletividade do município de Contagem, com flagrante desrespeito à Lei e à Constituição”. Erros anteriores a 2012 não estão contemplados por prescrição.

Poderes

O julgamento de setembro, o relator do caso no TCE, Sebastião Helvécio, acatou o relatório da procuradoria, voto seguido por Durval Ângelo. O conselheiro Cláudio Couto Terrão, contudo, discordou dos colegas e julgou as acusações improcedentes. Ele foi acompanhado por José Alves Viana e Gilberto Diniz. Terrão destacou que o projeto de isenção fora aprovado pela Câmara contagense e demonstrou preocupação com a independência dos poderes.

“As cortes de contas não têm competência para controlar a regularidade do processo legislativo que culminou na aprovação de uma norma, salvo para avaliar os atos administrativos decorrentes da lei produzida pelo parlamento”, sustentou, ao expor sua posição. Procurado pelo Estado de Minas, o conselheiro optou por não se manifestar, pois vai compor o conselho responsável pelo julgamento do recurso.

Eleita prefeita de Contagem a partir de 2021, Marília Campos salientou que, mesmo não tendo sido a responsável por elaborar a lei da gratuidade do imposto, formatou mecanismos para reparar as receitas perdidas. “Não deixei de estabelecer compensações em função da isenção. Não fui eu quem isentei. E, mesmo assim, estabeleci uma política de compensações”, disse, afirmando ter tomado ciência do recurso do Ministério Público de Contas por meio do contato feito pela reportagem.

“O que fizemos foi aplicar a legislação vigente no município. Como prefeito, o que fiz foi aplicá-la. Mostramos, também, que pela Lei de Responsabilidade Fiscal, não há nenhuma irregularidade naquele tipo de isenção. Você isentava uma parcela do tributo em contrapartida ao crescimento e movimento da cidade”, alegou o ex-prefeito Carlin Moura. “Imagine o contrário: você vira prefeito, tem uma lei mandando não cobrar, mas você manda cobrar. O que vai acontecer com você? Aí, sim, responderia por descumprimento da legislação”, comparou ele, que assume vaga de vereador em janeiro. O pedido original de Marcílio Barenco foi impetrado em 2017.

Ex-prefeito defende benefício

Estado de Minas procurou também o ex-prefeito Ademir Lucas, artífice da última lei de isenção do IPTU em Contagem. Por meio de nota, ele defendeu a gratuidade da versão domiciliar do tributo “É juridicamente possível isentar o IPTU residencial dentro da legalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal, tanto que foi um compromisso firmado na campanha de Felipe Saliba (Democratas) durante o último processo eleitoral”, assegurou, fazendo menção ao candidato apoiado por ele no pleito deste ano. Articulador da campanha, Ademir assumiria a Secretaria Especial de IPTU caso Saliba fosse eleito.

Assim como os sucessores, o ex-prefeito, embora não seja citado pelo MPC-MG, salientou ter apresentado estudo de impacto orçamentário sobre a isenção do IPTU e compensado a renúncia por meio de aumento na arrecadação advinda do setor industrial. “No caso dos prefeitos que me sucederam, entendo que, a avaliação deve ser feita caso a caso tanto pelo Tribunal de Contas quanto pelo MP, visto que esse mesmo trabalho de compensação de receita pode não ter sido seguido como em minha gestão. Os dois prefeitos ampliaram a faixa de cobrança do IPTU residencial”, completou.

Projeto na Câmara

O projeto que atrela os tributos municipais ao IPCA foi enviado pelo prefeito Alex de Freitas (sem partido) a pedido de Marília Campos, que assume em menos de um mês. Na prática, a mudança, se aprovada pelos vereadores, deve aliviar o impacto da inflação no reajuste do IPTU. Contas da área técnica da Câmara apontam que, se o IGP-M fosse seguido, o aumento seria de, aproximadamente, 24%. Com o IPCA, o percentual cai para em torno de 4%.

“O IGP M me pareceu muito mais gravoso à população no sentido de reajustar tributos. O IPCA me parece um índice de reajuste mais brando, por suas características e forma de cálculo”, apontou Luiz Otávio Ianini de Freitas, Diretor Legislativo da Câmara de Contagem. Em 2017, os vereadores arquivaram texto que tratava da isenção do IPTU. “Segundo o entendimento jurídico, da nossa procuradoria, o projeto de isenção de tributos teria que partir do Executivo”, pontuou Luiz Otávio, ressaltando que decisões jurídicas Brasil afora já consideraram o Poder Legislativo apto a sugerir a isenção.

Fonte: https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/12/21/interna_gerais,1222577/ministerio-publico-de-contas-quer-mudar-julgamento-sobre-o-iptu-de-contagem.shtml

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