MP de Contas vê sobrepreço de 237% em compra de aventais pelo governo de São Paulo

De acordo com o MP de Contas, a secretaria de Saúde adquiriu 340 mil aventais de proteção pelo valor unitário de R$ 32, mas, um mês antes, produtos similares foram comprados por R$ 9,50 pelo mesmo órgão. Sobrepreço total chega a R$ 4,6 milhões no contrato investigado.

O Ministério Público de Contas investiga contratos da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo com suspeita de sobrepreço de 237% na compra de aventais descartáveis usados para a proteção dos profissionais que atuam nos hospitais no estado.

De acordo com o relatório do órgão que SP2 teve acesso com exclusividade, no dia 8 de abril foram adquiridos 340 mil aventais de proteção pelo valor unitário de R$ 32, por meio da Coordenadoria Geral de Administração (CGA).

Menos de um mês antes da compra que está sendo questionada agora, o MP de Contas descobriu que o mesmo órgão do Governo do Estado de São Paulo já tinha comprado outras 500 mil unidades de aventais do mesmo modelo, de outra empresa, por um preço muito menor: R$ 9,50 cada avental. Ou seja, em abril o governo pagou 237% a mais por um produto similar.

Os investigadores do Ministério Público de Contas analisaram outras seis compras do mesmo produto feitas por hospitais estaduais, antes e depois do dia 8 de abril. O valor máximo encontrado foi de R$ 23,70 centavos.

Os técnicos do MP calcularam a média dos preços chegaram ao custo unitário de R$ 18,33. Com base nesse número, o Ministério Público de Contas concluiu que houve um aparente sobrepreço de R$ 4,6 milhões no contrato investigado.

Outras irregularidades

A investigação não ficou restrita apenas aos valores. O endereço da empresa fornecedora dos aventais também foi checado. A sede da Tecno 4 Produtos Hospitalares LTDA está registrada em um imóvel no bairro do Cambuci, região central da capital paulista.

Segundo o levantamento do MP de Contas, do valor total do contrato, de pouco mais de R$ 10 milhões, a empresa já recebeu R$ 8 milhões pelos produtos com aparente sobrepreço. Apesar da maior parte do pagamento ter sido feito, os procuradores não têm certeza se os aventais foram entregues.

“Como é uma empresa muito pequena, que, pelas contratações que nós analisamos dos últimos anos, ela não teve nenhuma contratação desse porte. Então, há uma dúvida se ela tinha, por condição própria, capacidade de fornecer essa quantidade de aventais. É preciso agora, e esse é o momento adequado pra verificar se efetivamente os aventais foram entregues”, afirma o procurador-geral do Ministério Público de Contas de SP, Thiago Pinheiro Lima.

A reportagem foi até a sede da empresa do Cambuci. Em um primeiro momento, um funcionário disse que o dono, Lucas Hiashiro, estava e que iria chamá-lo. Depois, disse que a sede não era no local e deu um número de telefone. Ao tentar fazer contato com a empresa, a secretária disse que Lucas Hiashiro não poderia atender.

“Ele está numa reunião agora. Você poderia estar passando seu contato e eu peço pra ele retornar de volta?”, disse a secretária.

A empresa Tecno 4 Produtos Hospitalares Ltda foi contratada com dispensa de licitação, por causa da decretação de calamidade pública em São Paulo, em razão da pandemia do coronavírus no estado.

Outras empresas também enviaram propostas de preço para o avental investigado. A documentação apresentada levantou indícios de que “uma das empresas pode ter tido prévio conhecimento do orçamento da outra”, segundo o relatório do MP de Contas. A formatação e os erros de português se repetiam em todas as propostas, segundo a investigação dos procuradores.

“A secretaria vai ter que demonstrar o porquê dessa contratação tão cara neste momento. Tudo bem: estamos passando por um preço de pandemia, os preços têm uma elevação natural, agora essa contratação especificamente destoou de todas as demais”, afirma Thiago Pinheiro Lima.

O que dizem os envolvidos

O dono da Tecno 4, Lucas Hiashiro, disse que já foram entregues 240 mil aventais do total contratado pela Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo. E que, por determinação da secretaria, o restante ainda não foi entregue para a adequação de preço. Sobre o valor cobrado, o empresário diz que o material dele é diferenciado e, por isso, é mais caro.

A Secretaria Estadual da Saúde, por sua vez, discordou da comparação de preços feita pelo Ministério Público de Contas e disse que esse lote de aventais corresponde a um tipo específico para uso em UTIs, com tecnologia superior aos aventais comuns.

“Não é correta a comparação feita pelo Ministério Público de Contas, que considera produtos diferentes. Assim, é também inadequada a afirmação sobre “sobrepreço”. Os aventais em questão (adquiridos a R$ 32) são modelo SSMMS, específico para uso em UTI – possuem cinco camadas, são impermeáveis e descartáveis – garantindo mais segurança aos profissionais de saúde que lidam com quadros mais graves da COVID-19 (têm, portanto, tecnologia superior aos aventais comuns). Esta foi a única compra deste item específico realizada durante a pandemia”, disse a nota da secretaria.

Ainda de acordo com o órgão, 96 mil aventais tiveram redução no preço. Saíram por R$ 27 cada um. E que a compra inicial de 340 mil aventais teve o cancelamento de 76,9 mil unidades, “a partir do monitoramento do cenário e dos estoques, que estão abastecidos”.

“É importante salientar que a Secretaria pagou somente o material efetivamente entregue”, afirmou a nota da secretaria, que também disse que um erro interno do governo gerou confusão nos modelos de aventais que constam no relatório do Ministério Público de Contas.

“O código Siafísico deste produto é nº 5605520. Após a veiculação da reportagem da TV Globo, a Secretaria de Estado da Saúde constatou preenchimento incorreto do código no processo, tendo sido utilizado o código de um avental comum, cujo código Siafísico é nº 5562775. Este tipo de avental mais simples, de fato foi adquirido ao preço unitário de R$ 9,50. As devidas correções serão feitas no processo”, declarou a secretaria.

A pasta da saúde também diz que “todas as compras feitas pela secretaria seguem a legislação, com pesquisa de mercado com o mínimo de três empresas como prevê a lei”.

“A pasta ainda não foi notificada pelo Ministério Público de Contas, mas está à disposição para esclarecimentos. Também se coloca à disposição para demonstrar à reportagem a diferença dos materiais de ambos os tipos de aventais”, afirmou o órgão.

Fonte:https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/07/07/mp-de-contas-aponta-sobrepreco-237percent-em-contrato-para-compra-de-aventais-para-hospitais-estaduais-de-sao-paulo.ghtml

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