Mulheres e negros são minoria nos Tribunais de Contas, aponta pesquisa

Negros e indígenas têm melhor representação entre magistrados que chegaram por concurso público e não por indicação política

Pouco conhecidos pela sociedade em comparação com o Ministério Público e cortes superiores do Judiciário, os Tribunais de Contas têm como principal função tornar a gestão pública mais eficaz e transparente por meio da fiscalização da aplicação de verbas e políticas públicas.

Essas cortes compõem um sistema de controle nacional independente e sem subordinação a outros Poderes. São 33 Tribunais de Contas em funcionamento no país com 235 magistrados e 125 substitutos, em um total de 360 julgadores em atuação.

Uma pesquisa inédita da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) traçou o perfil desses magistrados.

Segundo o estudo, há uma diferença significativa de raça, por exemplo, entre aqueles que ingressam na carreira por indicação política e aqueles que são aprovados em concurso público.

A pesquisa mostra que os homens são maioria entre os magistrados (84,6%) enquanto as mulheres são minoria (15,4%).

“A política brasileira segue sendo basicamente de domínio masculino, resultado de uma sociedade patriarcal e de um machismo que relega a mulher um espaço que não é esse. Nas indicações políticas, via de regra, são homens que indicam outros homens”, afirma o sociólogo Marcos Rolim.

Ele e a socióloga Daiana Hermann são autores do estudo “Quem são e o que pensam os conselheiros/ministros dos Tribunais de Contas e seus substitutos”. A pesquisa foi respondida por 34% dos magistrados, com nível de confiança de 95% e margem de erro de 7%.

Os julgadores do TCU são chamados de ministros e aqueles que atuam nos demais órgãos são chamados de conselheiros. Os substitutos são aqueles que ingressam por concurso público e substituem os conselheiros ausentes e atuam em câmaras com temas específicos.

Há duas maneiras de ingressar na carreira de julgador de contas. Os substitutos passam necessariamente por concurso público enquanto os ministros e conselheiros podem chegar aos cargos de maneira mista: por indicação política (Legislativo e Executivo) ou concurso, já que parte das indicações do Executivo devem partir da área técnica.

A maioria dos magistrados (65%) se declarou branca, seguida por pardos (32,5%), pretos (1,6%) e indígena (0,8%). Para a pergunta “Considerando sua cor/etnia, como o sr. (a) se declara?”, as respostas revelam uma diferença significativa entre os indicados por políticos e os aprovados em concurso público.

Entre os que passaram por concurso público, o número de negros e indígenas chega a 48,6%, muito próximo da metade, mostrando um maior equilíbrio. Entre os indicados políticos, negros e indígenas chegam a 29,5%, enquanto brancos representam 70,5%.

O equilíbrio maior entre negros e brancos entre os concursados, afirma o sociólogo, ocorre por causa das cotas previstas nos editais. “Certamente as cotas têm alguma responsabilidade e papel nisso. Mas independentemente delas, o concurso abre uma chance maior de valorização pelo mérito e não por posição de poder.”

“O Brasil é um país ainda profundamente marcado pelo racismo, não apenas das pessoas preconceituosas, mas sobretudo do racismo estrutural. Há instituições que sistematicamente reproduzem a exclusão sem se dar conta, dificultando a inclusão de negros”, diz Rolim, que é responsável pelo setor de Comunicação do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul.

Além do Tribunal de Contas da União (TCU), que julga as contas federais, existem outros 26 com atribuição estadual e mais um para o Distrito Federal. Há também dois tribunais que fiscalizam as prefeituras de São Paulo e Rio de Janeiro, além de três tribunais responsáveis unicamente pelas contas municipais das prefeituras dos estados da Bahia, Goiás e Pará.

“No mundo inteiro, os Tribunais de Contas estão se transformando em órgãos de boa governança, indicando medidas, sugerindo soluções e fiscalizando a aplicação do dinheiro público”, afirma Rolim.

Os magistrados também responderam questões sobre temas atuais ligados à política.

A maioria (65%) concorda que o Brasil vive um momento histórico em que “precisa reafirmar as conquistas democráticas, sob pena de retrocessos históricos e do risco de um novo período autoritário”, enquanto 17,9% responderam que “algumas das conquistas do processo de democratização precisam ser relativizadas para que se garanta mais segurança às pessoas”, e 17,1% que “faltam elementos para avaliar”.

Não houve diferença significativa entre os substitutos e demais magistrados.

Questionados sobre o papel da Lava Jato, 73,2% dos julgadores de contas responderam que a operação tem “cumprido um papel positivo, a par de eventuais erros”, enquanto 14,6% responderam que “tem cumprido papel negativo, a par de eventuais acertos” e 12,2% disseram que “faltam elementos para avaliar”.

Para Rolim, “a pesquisa evidencia que há uma tensão interna que pode ser muito produtiva. Há conselheiros com noção crítica do próprio funcionamento dos tribunais e que almejam reformas que aperfeiçoem o sistema”.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/01/mulheres-e-negros-sao-minoria-nos-tribunais-de-contas-aponta-pesquisa.shtml?origin=folha

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